domingo, 26 de abril de 2015

A MEMÓRIA NÃO SE APAGA: AS BOMBAS DA FLA

A MEMÓRIA NÃO SE APAGA: AS BOMBAS DA FLA
Texto de Manuel Sousa*


Introdução
Num comunicado publicado recentemente, a propósito das comemorações do aniversário da manifestação de 6 de Junho de 1975, a FLA afirma que “não é um partido político. Não sustenta nenhuma ideologia ou forma particular de idealismo partidário. Não produz orientações nem de esquerda nem de direita. Não é uma organização formalmente constituída. Não apoia ações de desordem pública ou de recurso à violência”.
As afirmações constantes no parágrafo anterior poderiam levar à conclusão de que a FLA de hoje pouco tem a ver com a que atuou durante e alguns anos após o Verão Quente de 1975 se não fosse prática da FLA proclamar uma coisa e não agir em conformidade.
Com efeito, basta ler as afirmações dos seus principais dirigentes aos diversos órgãos de comunicação social ou ao seu jornal oficioso “O Milhafre” ou conhecer o percurso político dos seus líderes e principais apoiantes para facilmente se confirmar que a FLA foi uma organização de extrema-direita, com líderes ligados à ditadura de Salazar e apoiada e dirigida (?) por estrangeiros ligados a organizações terroristas, como é o caso da OAS, de França.
Quanto ao não apoio a ações de desordem pública, os factos ocorridos entre 1975 e 1979 também demonstram o contrário. Daniel de Sá , sobre o qual não recai qualquer suspeita de preferências esquerdistas ou de ideologia comunista, a propósito da atividade da FLA escreveu:
“Foram postas bombas artesanais feitas com botijas de gás, várias pessoas foram agredidas, automóveis queimados, a sede de alguns partidos e a casa da família do Jaime Gama incendiada. (Os primeiros incendiários foram extremistas de esquerda, que pegaram fogo à sede do Movimento para a Autodeterminação do Povo dos Açores, antecedente “legal” da FLA, fundado por gente do PPD.) Quando o diretor do “Açores” arrefeceu o seu apoio à causa também apanhou com uma bomba em casa por represália, bem como Américo Natalino de Viveiros, secretário do governo regional, pelo mesmo motivo.”
Não pretendendo ser exaustivos, apresentam-se, a seguir, alguns exemplos da atividade terrorista da FLA.

As Bombas da FLA

A 4 de Novembro de 1975 rebentou uma bomba na cerca do Comando Naval dos Açores e a 6 de Novembro rebentou outra, no pátio da casa de Francisco Macedo, conhecido dirigente do Partido Socialista de Ponta Delgada. Não havendo vítimas humanas a registar, o estrondo foi ouvido numa grande área da cidade de Ponta Delgada e partiu vidros da residência daquele socialista e das casas vizinhas e provocou estragos de pouca monta no automóvel daquele militante socialista.
Embora sem citar qualquer nome, num comunicado publicado no jornal Açores , a 7 de Novembro de 1975, a Juventude Socialista refere que “os acontecimentos dos dias 4 e 6, inserem-se na atividade criminosa desenvolvida por um certo grupelho que à boa maneira fascista renuncia aos métodos democráticos próprios da sociedade em que queremos viver, para optar pelos métodos ditatoriais de alienação, manipulação e intimidação pela violência, próprios da sociedade que eles pretendem construir: a sociedade totalitária”.
A 17 de Novembro de 1975, a sede do Partido Socialista de Ponta Delgada é atacada à bomba, tendo sido danificada a porta de acesso, as vidraças do edifício e de outros vizinhos. O Jornal Açores do dia seguinte salientou o facto de a notícia ter sido dada uma hora depois pelo Rádio Clube Português.
A 21 de Novembro de 1976, rebentou um engenho explosivo de fabrico caseiro, que foi atirado da rua para o jardim do Palácio da Conceição, residência do Ministro da República Galvão de Figueiredo, tendo havido alguns danos materiais. De acordo com um comunicado do Governo Regional dos Açores, publicado na edição de 22 de Novembro do Diário dos Açores , o ataque bombista colocou em risco a vida do “guarda da PSP de serviço ao Palácio da Conceição, que se encontrava a curta distância, no momento da deflagração do engenho, dentro do jardim.
A 15 de Abril de 1978, rebentou uma bomba junto da residência de Milton Morais Sarmento , o qual, de acordo com o jornal Bandeira Vermelha , havia assinado “um comunicado da UDP denunciando os terroristas da FLA”.
A 28 de Outubro de 1978 rebentou na residência do diretor do jornal Açores uma bomba que segundo José Ricardo, do semanário “O País” , “não vitimou nem Gustavo Moura nem a sua família, apesar dos elevados prejuízos que causou.
Na madrugada de 29 de Janeiro de 1979, foram cometidos dois atentados bombistas, um que destruiu o automóvel de Américo Natalino Viveiros e outro que causou prejuízos nos móveis e numa casa do Dr. Francisco de Bettencourt , nas Furnas. Em ambos os casos o engenho explosivo usado era artesanal, sendo constituído por uma bilha de gás butano, das de 5 kg, carregada de pólvora e de explosivo plástico.
Aqueles atentados foram condenados pela Comissão Coordenadora Regional do Partido Socialista e pelo Governo Regional dos Açores que em nota oficiosa, publicada no Açoriano Oriental mencionava que “O terrorismo é um dos mais tristes sinais dos tempos em que vivemos. Linguagem dos que rejeitam a liberdade para defender as suas opiniões, o terrorismo invalida e conspurca quaisquer propósitos que pretenda servir, pois segundo os critérios da sã moralidade, que se aplicam também à ação política, os fins não justificam os meios”.
No dia 31 de Janeiro de 1979, o Correio dos Açores divulga um comunicado da UDP onde esta organização condena os atentados bombistas contra a viatura de Natalino de Viveiros, a residência do Dr. Francisco Bettencourt e contra o diretor do jornal Açores e denuncia o facto de “Mota Amaral, o Governo Regional dos Açores e a direção Regional do PSD ajudaram a criar e a alimentar um monstro que não conseguem controlar e que acabará por os ajudar a destruir”.
A 31 de Maio de 1979, o jornal Açoriano Oriental noticiava que no dia anterior, a polícia Judiciária prendeu o cidadão francês Paul Raingeard de La Blétiere , conselheiro jurídico e comercial, sob a acusação de atividades terroristas. Esta prisão sucedeu na sequência da de José Humberto da Costa Patrício ocorrida no dia 22 do referido mês, também acusado de envolvimento em atividades terroristas. No mesmo jornal, é referido o facto do madeirense, Eduardo Mendonça, sem qualquer profissão conhecida, que se encontrava em São Miguel, pelo menos desde o verão de 1978, se encontrar a monte, contra o qual existiam vários mandatos de captura por ser suspeito de envolvimento em atividades terroristas.
De acordo com o que se pode ler numa crónica de Vamberto Freitas primeiro publicada no Diário de Notícias e transcrita no Jornal Açores em 15 de Abril de 1982, Blétiere foi “considerado por elementos próximos da FLA como sendo o cérebro do separatismo nos Açores, um dos estrategistas máximos do movimento no arquipélago”. Noutro passo do mesmo texto também se afirma que Blétiere, que havia sido “transferido para Portugal no início da década de 60 quando o exército e os serviços secretos franceses correram com a organização do seu país após outra tentativa de assassínio contra De Gaule “, depois de uma reunião em Londres “chegou aos Estados Unidos com José de Almeida para fundar e dirigir o governo clandestino da FLA em Fall River, Massachusetts”.

25 de Abril de 2015